quinta-feira, 18 de agosto de 2016

MONS. MARCEL LEFEBVRE, EXCOMUNHÃO E CISMA – PARTE 3 e 4

PARTE 3

CARDEAL DARÍO CATRILLÓN HOYOS

Antes de iniciar as respostas é bom relembrar algumas coisas. Mons. Marcel Lefebvre cometeu DOIS delitos passíveis de excomunhão: a consagração de bispos sem o mandato papal e o cisma. A consagração de bispos pode estar desacompanhada do delito de cisma. O Cardeal Castillo Lara explicou muito bem essa questão:

"No caso de Lefebvre e os quatro sacerdotes ordenados bispos por ele, há duas infracções canonicamente falando, que eles cometeram. A infração fundamental é aquela de cisma, isto é, recusar-se a submissão ao romano Pontífice e romper com a comunhão com a Igreja. Esta infração eles já tinham anteriormente cometido. Só que, agora, a segunda infracção, aquela da consagração de bispos, formaliza e, em certo sentido, concretiza a primeira, e a torna mais explícita. O cisma é um delito que pode ser pessoal. Ele não requer um número de pessoas. As pessoas podem fazê-lo por conta própria. Lefebvre e seus seguidores, na medida em que eles se recusaram submissão ao Papa, já estavam, por esse fato em si, em cisma. A intenção do ato de consagrar bispos, já é de criar uma igreja com sua própria hierarquia. Neste sentido, a consagração de bispos torna-se um ato de cisma. Deve-se ter em mente, contudo, que o ato de consagrar bispos não é em si um ato cismático. Na verdade, no Código, onde aborda as infracções, estas duas são tratadas sob duas seções distintas. Há delitos contra a religião e a unidade da Igreja. E estes são apostasia (por exemplo, renunciar a fé), cisma e heresia. Consagrar um bispo, sem mandato pontifício, é, por outro lado, uma ofensa contra o bom exercício de seu ministério. Por exemplo, houve a excomunhão do Arcebispo vietnamita, Ngo Dinh Thuc em 1976 e 1983 por uma consagração episcopal, mas não foi considerado um ato cismático porque não havia nenhuma intenção de romper com a Igreja. NgoDinhThuc representa uma situação lamentável, já que envolve um certo desequilíbrio mental”.

Quanto a frase do Cardeal Darío Castrillón Hoyos: "Dom Lefebvre continuou com a consagração e, portanto, verificou-se aquela situação de separação, AINDA QUE NÃO SE TRATE DE UM CISMA formal". (D. CastrillónHoyos, Revista 30Giorni, No. 9, Setembro 2005. http://www.30giorni.it/articoli_id_9442_l6.htm)

Brian Mershon enviou uma carta direcionada ao Cardeal Darío Castrillón Hoyos, Presidente, Commissão Pontifícia Ecclesia Dei (PCED), mas que foi respondida pelo Mons. Camille Perl, Vice Presidente da Comissão sobre o status canônico da FSSPX, onde tocava no tema das expressões do Cardeal Castrillón sobre “cisma formal”, que recebeu a seguinte resposta:

“As declarações feitas pelo Cardeal Castrillón devem ser entendidas em um sentido canônico, técnico. Afirmar que a Sociedade de São Pio X “não está em cisma formal” é dizer que não há declaração oficial da parte da Santa Sé de que a Sociedade de São Pio X está em cisma”. O que indicaria que ele quis se referir à FSSPX quando fala da “situação de separação, ainda que não se trate de uma cisma formal”.

Repetimos as distinções:

CISMA FORMAL – Pode ser entendida em três sentidos. 1. Por cisma formal, pode-se entender aquele que possui declaração oficial da parte da Santa Sé de que alguém ou um grupo está em cisma. 2. Por cisma formal, pode-se entender aquele em que há malícia interna, pecado. 3. Aquele que faz um ato cismático que com toda propriedade é cismático e não apenas faz algo materialmente cismático.

CISMA MATERIAL – 1. Por cisma material, pode-se entender aquele que não possui declaração oficial por parte da Santa Sé. 2. Entende-se aquele cisma sem malícia interna, de boa fé. Os cismáticos materiais, neste sentido, estão fora da Igreja, embora não possuam culpabilidade subjetiva.

O Padre Brian W. Harrison dá exemplo de herético material: “Assim, alguém nascido e educado como, digamos, russo cristão ortodoxo, que nunca ouviu falar proveitosamente, e talvez nem sequer acidentalmente, acerca do Romano Pontífice e seu papel na Igreja, seria um exemplo de um simples cismático material: certamente não se pode presumir malícia em tal pessoa” (¿Cuánta desobediência constituiria un cisma?). Assim como, os hereges materiais estão fora da Igreja: “Todos os teólogos ensinam que hereges publicamente conhecidos, ou seja, os que pertencem a uma seita heterodoxa por profissão pública, ou que rejeitam a autoridade magisterial infalível da Igreja, estão excluídos do corpo da Igreja, mesmo se sua heresia for apenas material.”(Adolphe Tanquerey,

ManualofDogmaticTheology). 3. Por cisma material pode-se entender quando não é cismático no sentido estrito do termo, mas apenas faz algo externamente cismático. Por exemplo, no grande cisma do Ocidente, onde mesmo santos – por engano – prestaram obediência para antipapas.
É verdade que o Cardeal Darío Castrillón Hoyos defendia, mesmo antes da retirada da excomunhão, que os bispos, padres e fiéis da FSSPX não eram cismáticos. Mas ele é claro que Mons. Marcel Lefebvre cometeu um ato cismático e que, portanto, seus bispos eram um produto de uma ação cismática de Lefebvre. “Os Bispos, Padres e fiéis da Sociedade de São Pio X não são cismáticos. Foi o Arcebispo Lefebvre quem empreendeu uma consagração episcopal ilícita e, portanto, realizou um ato cismático. Foi por essa razão que os bispos consagrados por ele foram suspensos e excomungados”. (http://rorate-caeli.blogspot.com/2007/02/for-record-castrilln-bishops-priests.html ). Nesta explicação vemos que ele diz claramente que Mons. Lefebvre cometeu um ato cismático e, que os bispos consagrados foram excomungados, embora não sejam cismáticos, mas que os padres e os fiéis da FSSPX não caem em nenhuma dessas excomunhões. Devemos lembrar que essas explicações que ele dá são de muito depois da morte de Mons. Lefebvre, então não o estava incluindo como “não cismático”, no lugar diz que este cometeu um ato cismático. Ora, no caso dos Havaianos, Cardeal Ratzinger diz que os atos referidos pelo decreto do bispo não são “atos cismáticos formais”, Cardeal Darío Castrillón Hoyos está dizendo aqui, por outro lado, que a sagração de Mons Lefebvre foi um ato cismático. Onde está a contradição entre o documento de 1988 e a fala do Cardeal Castrillón Hoyos? Em algum momento negou que é impossível aderir ao cisma de Mons. Lefebvre?


PARTE 4

MONS. MARCEL LEFEBVRE, EXCOMUNHÃO E CISMA 
PE. GERALD MURRAY E A GAVETA DO PAPA BENTO XVI

A página radtrad pôs em dúvida a Carta do Pe. Gerald Murray, onde este obrigou  o Pe. Peter R. Scott da FSSPX a corrigir seu panfleto  "A Fraternidade de São Pio X é cismática? Excomungada? Roma diz que não”, onde fazia uso indevido das afirmações do Pe. Murray. Mas a carta do Pe. Gerald Murray encontra-se em “Latin Mass magazine” e também sua retratação, publicados na edição de Verão de 1996. Esse artigo na mesma Revista confirma a retratação e traz algumas citações do Pe. Murray contra a sua própria tese: http://www.latinmassmagazine.com/articles/articles_2002_SU_Devillers.html (site oficial da Revista). Um artigo da própria FSSPX concorda que houve retratação: http://sspx.org/en/canonical-study-1988-consecrations-2

O bispo Fabian W. Bruskewitz faz menção e cita a Carta do Pe. Gerald Murray que acusava as falsificações por parte da FSSPX aqui: http://archives.sspx.org/diocesan_dialogues/Lincoln_diocese3.pdf

Portanto, esta mais do que provado a veracidade da Carta e da Retratação do Pe. Murray.
A página radtrad afirma que Bento XVI removeu a excomunhão dos bispos em 2009 levando em conta a tese do Pe. Murray, que supostamente estaria em sua gaveta dois meses antes do decreto de remoção. Isso é uma aberração! O autor da página ficou toda hora nos acusando de ignorantes e também que não sabíamos ler, e agora está afirmando uma bobagem a partir de uma interpretação errônea que fez de um link. Que absurdo! O link que ele pôs não afirma isso: https://googleweblight.com/?lite_url=https%3A%2F%2Ffratresinunum.com%2Ftag%2Ftese-murray%2F&ei=uWAosK5L&lc=pt-BR&s=1&m=347&host=www.google.com.br&ts=1471188694&sig=AKOVD64dfM3D7iB_Svat2DN6XbAkTEM-2A

A fonte direta (que não é o Fratres) apenas diz que no escritório de Bento XVI está um decreto para remover a excomunhão e nem se menciona o Padre Murray, muito menos que sua tese estaria na gaveta do Papa dois meses antes. Isso é uma tolice!


ADENDO:

A página radtrad faz uso de uma frase de uma Nota do Representante Permanente da Santa Sé junto ao Conselho da Europa. Esta citação por eles colocada diz: "É verdade que cada pessoa dispõe da faculdade de contestar o Magistério ou as prescrições e as normas da Igreja. Em caso de desacordo, cada pessoa pode exercer os recursos previstos pelo Direito Canônico.". Com isso, eles querem legitimar as contestações públicas aos ensinamentos do magistério como um direito dos fiéis. É claro que isso é uma bobagem. Primeiro, a própria nota diz um pouco antes: “Assim, um fiel leigo ou religioso não pode, contra a Igreja, invocar a sua liberdade para contestar a fé (por exemplo, TOMAR POSIÇÕES PÚBLICAS CONTRA O MAGISTÉRIO)”. Outra coisa, a página radtrad corta a frase e coloca um ponto no final como se a frase tivesse sido encerrada. A frase completa na verdade diz: "É verdade que cada pessoa dispõe da faculdade de contestar o Magistério ou as prescrições e as normas da Igreja. Em caso de desacordo, cada pessoa pode exercer os recursos previstos pelo Direito Canônico E ATÉ MESMO ROMPER A SUA PRÓPRIA RELAÇÃO COM A IGREJA”. Alguém em sã consciência acha que romper sua relação com a Igreja Católica é um direito dos fiéis?

O que estava em jogo era a liberdade da Igreja em agir segundo as próprias regras, pois a Corte Européia deveria ou não estabelecer se o poder civil respeitou a Convenção Européia dos Direitos do Homem, ao rejeitar o reconhecimento de um sindicato profissional de sacerdotes (na Romênia) e rejeitação a nomeação de um professor de religião que publicamente professava posições contrárias à doutrina da Igreja (no caso da Espanha). Pretensos direitos à liberdade de associação e à liberdade de expressão foram invocados para obrigar as comunidades religiosas a agirem contra os seus estatutos canônicos e contra o Magistério. Ou seja, admitir o professor que se opunha ao Magistério e também que sacerdotes fizessem um sindicato profissional. ´

É claro que a pessoa possui liberdade (livre arbítrio) para se opor ao Magistério e às normas da Igreja. Mas isto fará ou romper suas relações com a Igreja (e aqui não há um direito) ou de acordo com direito canônico no que diz respeito às normas da Igreja. Ora, um teólogo que tem uma objeção a ensinamentos não infalíveis deve comunicar-se diretamente a autoridade em questão e não fazer isso de modo público: “Nestes casos o teólogo evitará recorrer aos « mass-media » ao invés de dirigir-se à autoridade responsável, porque não é exercendo, dessa maneira, pressão sobre a opinião pública, que se pode contribuir para o esclarecimento dos problemas doutrinais e servir a Verdade”.  (Donum Veritatis). O Código de Direito Canônico não fala sobre possibilidade de contestação pública ao Magistério:

Dominique Le Tourneau: "Dentro desta categoria se inclui o direito a liberdade de expressão e a opinião pública na Igreja. Este duplo direito deve salvaguardar tanto a integridade da fé quanto a da moral (PARA OS QUAIS NÃO TEM LUGAR A LIVRE OPINIÃO QUANDO O MAGISTÉRIO SE PRONUNCIOU DE MANEIRA AUTÊNTICA SOBRE UM PONTO DETERMINADO), respeitar aos pastores, e ter em conta o bem comum e a dignidade das pessoas que constituem os limites ao exercício deste direito, o qual está em função da ciência, da competência e do prestígio de que gozem os fiéis (c. 212 § 3) (Cuestiones de drecho canônico, 1992, 86-87)

Não pode restar dúvida que negar assentimento a pontos não infalíveis do Magistério é pecado grave (a não ser que um teólogo ou um leigo bem formado tenha razões de peso ao fazer isso, e mesmo assim não poderão tornar públicas suas objeções):

F. Gallati:

1) A disposição de princípio em acatar as decisões do magistério ordinário da Sé Apostólica é certamente requerida sob pena de pecado grave (...)

2) Mas o fiel está obrigado, em geral, sob o pecado grave, a dar o assentimento interior (assensus religiosus) às decisões particulares do magistério ordinário, cujo detentor é aquele que ocupa a Sé Apostólica... Negar o próprio assentimento ainterior a semelhante decisão magisterial não definitiva equivale a desprezar o magistério supremo da Igreja e, em última análise, o seu próprio Fundador, que transmitiu esta autoridade ao sucessor de Pedro..." (Wenn die Päpste sprechen" (Viena 1960) 168-171)

Pe. Antônio Royo Marín:

"Quem recusa aceitar as proposições doutrinais que a Igreja apresente como não revelada, não é propriamente herege, porém peca gravemente contra a obediência devida à autoridade da Igreja em doutrinas relacionadas com a fé e os costumes enquanto não sejam expressamente reveladas.
Que não é propriamente herege é evidente, pois com isso não se opõe a autoridade de Deus, que revela (objeto formal da fé) mas unicamente ao magistério eclesiástico em doutrinas não reveladas. Mas é claro que também peca gravemente contra a sujeição e obediência devidas à autoridade da Igreja quando propõe aos fiéis com seu magistério autêntico (enquanto não infalível) doutrinas relacionadas com a fé e os costumes ou para defesa delas, já que sempre se trata de coisa grave, como procedente da Igreja, regida e governada pelo Espírito Santo. E assim, v.gr., pecaria mortalmente aquele que se opusesse pertinazmente a algum ensinamento dado pelo Papa em alguma encíclica dirigida a toda a Igreja, ainda que não se refira a matéria estritamente dogmática.
E se note que não basta evitar o pecado com o chamado silêncio obsequioso do que cala exteriormente, mas dissente por dentro, mas há de render-se mesmo interiormente diante da autoridade da Igreja." (Teologia Moral para Seglares)

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